segunda-feira, 19 de julho de 2010

Os dois últimos dias...

A noite de sábado para domingo deve ter sido a que dormi sob mais efeito de álcool por aqui, mas tava bem, principalmente depois de comer um pizza e tomar Coca antes de dormir. Aliás, tomar Coca não, Pepsi. Por que isso é importante? Porque lembrando no dia seguinte do que aconteceu eu ri muuuuuito. Vejam o que uma pessoa bêbada e sem memória pode fazer: cheguei e fui tomar Coca Zero, que tava na geladeira, esperando a pizza. Tomei o primeiro gole e pensei "se eu colocar no congelador, enquando a pizza chega ela vai ficar maravilhosamente gelada". Coloquei lá. A pizza chegou, veio de brinde uma Pepsi. Fui até a geladeira e não achei a Coca Zero. Intrigado, procurei pela casa inteira, até que desisti e tomei a Pepsi. Isso mesmo, eu esqueci onde tinha colocado a Coca! Acordei às 5h pra ir ao banheiro e lembrei dela. Tirei do congelador e tomei um gole do que não tava congelado ainda... Olha que absurdo?! haha

Bom, depois da Coca voltei a dormir, rindo sozinho. Volney, o aniversariante do dia, veio nos acordar com seu típico bom humor matinal (pra ele o dia começaria assim que sai o sol). Disse que precisávamos acordar pra ir pra Uruçuca, onde aconteceria um almoço pelo aniversário dele. Ainda era 7h30 da manhã e a Globo passava Bahia Rural.

Em Uruçuca andamos pela cidade tempo suficiente pra eu finalmente aprender os caminhos de um lugar para o outro, ainda que continue errando. O almoço era na casa de Mirinha, a mãe do aniversariante. Entre os presentes, Antônio, avô de Thomaz e ex-marido dela, com a esposa (sim, eles todos tem um ótimo relacionamento!), Harley e Ivana, irmãos de Volney, a família de Célia, prima de Volney e dona Vanda, amiga de Mirinha.



Um lado da sala...


... e o outro!

A comida do almoço me reservava uma feliz novidade: Pitu! É bonito e aparentemente complicado como o Caranguejo, mas é bem mais fácil de comer. A casca das patas dele quebra no dente, sem precisar de martelo. A carne é maravilhosamente gostosa, e o rabo parece um camarão gigante, no gosto, na textura e no formato. Também tinha catado de caranguejo (que é o caranguejo já fora da casca - agora que conheço o catado não sei porque alguém comeria o caranguejo inteiro!), uma fritada de alguma coisa do mar também, arroz, salada, carne de sol e feijão de moqueca.


Uma das panelas de pitu

De sobremesa, mais novidade pra mim, e essa não é regional: ambrosia. Um doce-de-leite com frescura, como diria o Thomaz. Bem gostoso! Na sala, um animado papo depois da comida, que girava em torno de Bruno do Flamengo ("o time do Flamengo é bom, o que mata é o goleiro", e por aí vai...), a proibição das palmadas educativas, e novidades sobre pessoas conhecidas deles. E isso é muito engraçado pelo tamanho da cidade. Quando aparece na conversa um Fulano, que alguém não sabe quem é, logo vem a referência, "ah, ele é filho de Sicrano e cunhado de Beltrano". Isso tudo tratando só pelo primeiro nome, e todo mundo conhece!

A noite mais uma experiência nova: fomos ao culto com os pais do Thomaz na Igreja Batista. Como ele mesmo disse brincando pra mãe: "eu não posso recusar, porque sou seu filho, e Iuri também não porque é o hóspede". Quando o assunto é religião, penso que é algo não se discute, portanto não vou fazer comparações, só me limito a dizer que fui muitíssimo bem recebido como convidado. Cada um encontra Deus onde achar que deve, e o mais importante são as atitudes das pessoas, e não a religião que seguem.

Falando em bem recebido, fomos depois jantar na casa de Genílton, amigo da igreja, junto com um pastor visitante, de Brasília, e o pastor Pedro. Gente boa, muito simpática, e tivemos altas conversas sobre futebol (de que me livrei logo das brincadeiras, afinal não sofro do mesmo mal que eles, que é o futebol carioca), jornalismo e sobre política, que foram as mais animadas. Animada principalmente pra mim, já que o coro ali era pela companheira Dilma. Ah sim, e o cardápio me trouxe mais uma novidade, farofa de banana, muito boa como o resto das coisas que comi por aqui.

Continuando na comida, desde que cheguei percebi que às vezes me deparava com um sabor meio adocicado que eu não gostava na comida, principalmente na salada. Mas era algo discreto. Até que hoje no almoço senti o tempero no arroz de Cinira, e consegui encontrar a "plantinha". Perguntei o que era e todo mundo na mesa sorriu. "Nenhum paulista gosta de coentro, né?". Claro que ninguém achou que eu realmente não gostava, afinal comi horrores e tudo por aqui tem coentro, mas realmente não gosto tanto. Percebi claramente o que era hoje porque a Cinira gosta muito, e coloca pedaços grandes na comida. Soube também que o paladar do paulista com o coentro é diretamente proporcional ao do baiano com a salsinha, que pra mim já é imperceptível e pra eles é forte. Interessante, não?

Depois do almoço fomos ao Mercado de Artesanato comprar mais souvenires. Aliás, esqueci de tirar foto desse mercado e também do mercado municipal daqui, que é um caos e muito maior que o de Piracicaba. Passamos parte da tarde na Lan House e no fim do dia fomos na Barrakítica, que é, como o nome indica, a junção das palavras barraca e raquítica. O bar/restaurante é da década de 80, um dos mais tradicionais da cidade e que nunca fechou (diferente do Vesúvio, que durante a crise do cacau foi afetado junto com a economia da cidade e fechou por alguns anos). No cardápio tinha de tudo: peixes, pratos à la carte, pizza, porções e comida japonesa. E pra não dizer que não comemos de tudo MESMO, arriscamos a comida japonesa. Feliz escolha, a de lá era muito boa! E olha só: na Barrakítica não tem Nova Schin... tomamos Skol mesmo.

Esse post, começou a ser escrito na tarde de ontem, em Ilhéus, e concluído agora já aqui em Piracicaba, onde já estou. De repente faço um post síntese em um dos dias dessa semana. Agora, volto à rotina de Piracicaba. Quer dizer, não bem à rotina, mas à rotina de férias em Piracicaba...



Fechem portas e janelas!

Essa é a palavra de ordem quando o prato é pitu (assim sem acento, o acentuado é a cachaça), quem experimenta gosta e quem gosta é viciado. Por ser um prato caro e difícil de encontrar, as oportunidades que se tem devem ser aproveitadas da melhor maneira possível, por isso tome seis quilos do bicho pra dentro.

O catado de caranguejo é uma coisa que eu tinha certeza que o Botão ia gostar, uma vez que essa é a criatura mais adepta à praticidade do planeta. Mas eu sou a favor de quebrar o bicho pra comer, além da gordura (descartada no catado), tenho a sensação de que é um outro prato completamente diferente. Vai saber.

O tempero é, de longe, a maior unanimidade entre paulistas. Nenhum deles gosta do tal do coentro! Exceto uma ou duas pessoas. Veja lá, meu amigo passou por experiências gastronômicas inacreditáveis, do sarapatel de Maria Peixera ao Pitu de dona Cinira e tropeçou com o bagulho mais imperceptível (na minha opinião) possível.

No mais, o aniversário de meu pai foi bem legal, a conversa e a risada foram predominantes. Na igreja, tudo como o esperado, uma galera muuuito gente boa e sempre "casa-cheia", também não discuto muito fé, mas acredito que os religiosos tem construções de discurso fantásticas.

Nesse ponto eu entro no documentário citado no post anterior; é incrível a coragem e capacidade de liderança do pastor do documentário. Tem no youtube e quem quiser pode ver, vejam também notícias de uma guerra particular, igualmente bom. Creio que ver esse conteúdo nos dá uma nova ótica sobre a temática da violência, emendo aqui uma recomendação de leitura: Abusado, Caco Barcellos. Genial.

Ouçam Black Alien, Funkeiro e Racionais. Som de suburbano, pobre, brasileiro.

Trivela com chuva

Depois da última postagem, de Porto Seguro, dormi como uma pedra. Aliás, uma pedra que ronca e conversa, segundo Thomaz. Chegamos em Ilhéus com chuva e ruas alagadas. Não saberia dizer desde quando chovia e nem com qual intensidade, mas sei que não é exagero a comparação de Ilhéus com o Rio de Janeiro, a "cidade de papel crepon", como definiu Thomaz, pela característica de se desmanchar inteira com uma chuvinha. Na manhã do sábado ainda chovia, e as expectativas para o Trivela, o show do Asa, pra mim eram ruins. Só pra constar, domingo à noite ainda tinham ruas alagadas, apesar de a chuva ter parado...

Não fizemos nada no pedaço de dia que ficamos acordados antes do show, afinal a abertura do portão estava marcada para às 16h. Como o apartamento aqui fica ao lado do Centro de Convenções, onde aconteceu o show, desde às 15h já ouvíamos barulho de música dos carros e de gente se encaminhando pra lá.

Tinha uma galera concentrada na frente, aproveitando para consumir toda a bebida que pudesse antes de entrar, já que lá dentro provavelmente tudo seria mais caro. E de fato era. Tudo bem que fora era MUITO barato: latão de Skol era 3 por R$ 5, e latinha R$ 1. Mais barato que no mercado e geladíssimas! Tomamos umas ali antes de entrar, afinal já eram quase 18h.


A entrada do Trivela, que apesar de ser aqui, tinha patrocínio da Skol

Mal entramos, compramos algumas fichas (lá dentro a Skol custava R$ 3, o que não achei caro pra um show) e o DJ que tocava em um grande palco parou. De repente ouvi os primeiros sons da guitarra de Durval Lélis e estranhei o fato de não ver a banda no palco. O Thomaz apontou para o lugar de onde vinha o som e aí entendi o porquê de a festa se chamar Trivela: eles tocam em cima de uma Trivela/Trio, que anda pelo meio do povo.

O show agita demais e a chuva até ajudou a refrescar, embora eu não seja desses que fica pulando muuuuito em um show de axé. Mas curti o suficiente cantando "O assa arrêa, arrêa, arrêa, arrêa, arrêa!" e "Quebraê, quebraê, olha o Asa aê". Me perdi do Thomaz mais ou menos no meio do show e só nos reencontramos no final. Falando em final, os caras tocam MUITO tempo. O Asa começou tipo às 18h, e parou às 22h! Depois veio a banda Kelsh, do sobrinho do Durval. Depois o Volney perguntou se ele tocava bem e, diante do silêncio, concluiu: "É, se o tio dele não é lá aquelas coisas, porque ele seria?". Na verdade, o forte desse povo é a animação, o pique e o carisma, nenhum deles é um super músico...


Eita povo animado!

A galera na festa pra mim não tinha muita diferença da galera que vi na Banda Eva em Piracicaba, festa do mesmo estilo. Isso falando do tipo de gente, da animação, etc. Criatividade nas roupas, animação, gente doida pra beber, pular e beijar na boca. Percebi, mais uma vez, que não é esse o meu tipo de festa. Quero dizer, vou, curto, mas não me sinto à vontade como em um barzinho jogando conversa fora...

Não ficamos até o fim da Kelsh. Pedimos da rua, no caminho de casa, uma portuguesa grande da pizzaria Pinóquio, que comi quase inteira porque o Thomaz capotou logo depois do banho e mal experimentou. Falando em comer (e o próximo post vai falar muito de comida), toda essa comilança me rendeu um ganho de 1,5kg, o que não é pouco, mas também não é muito, considerando que nas férias de Julho, em Piracicaba, eu provavelmente engordaria também, afinal só faço comer e dormir nessa época...

Mudando de assunto, aqui tem muitas dessas bancas de CD/DVD pirata. Tive a oportunidade de usufruir de algumas dessas aquisições. Uma delas é um CD que fica no carro, chama MPB MP3 e tem 428 faixas. É o que to copiando agora na Lan House e de onde ouço no momento Caetano, Gil, Leoni e Geraldo Azevedo. Muito bom! Também vi dois filmes, um que a mãe do Thomaz comprou, que chama Sedução, e apesar de bem feito tem um roteiro meio doentio. A história se passa em um internato de meninas.

O outro foi um documentário que acompanha um pastor evangélico (ex-traficante), policiais e traficantes nas favelas cariocas. Na capinha do piratão está escrito Rio Favela. Procurando agora pela internet descobri que o diretor, Jon Blair, é inglês, e que o filme tem o nome oficial de Dançando com o Diabo, que surgiu de uma das falas do pastor explicando sobre como desistiu do tráfico: "Percebi que tinha duas alternativas: caminhar com Deus ou dançar com o diabo", disse o pastor Dione, em uma das primeiras cenas do filme.

O acesso do pastor nas favelas comandadas pelos diferentes traficantes é impressionante, e ele tem acordo de trégua com todos eles, o que permitiu à equipe de cinegrafistas estrangeiros gravar todos os depoimentos. Tem histórias impressionantes, carregadas de violência, e retrata um Rio de Janeiro muito famoso depois de Cidade de Deus, só que no caso não é ficção, mas um retrato da realidade. A camisa do Flamengo de um dos bandidos, bem atual, nos dava indícios de que o filme era bem recente, e descobri agora que ele estreou no Festival de Cinema do Rio de Janeiro no ano passado. A última informação que achei na internet é da época do festival, e revelava que os produtores procuravam um meio de distribuí-lo no Brasil. Não sei se existe um meio oficial de distribuição, mas os camelôs de Ilhéus já tem...

Ah sim, e pra não dizer que saí daqui sem nenhum machucado: ontem raspei a perna descendo do carro. Não to falando isso pra fazer drama, mas pra compartilhar com vocês uma constatação de utilidade pública a que chegamos. Nas palavras de Thomaz: "a Strada cabine dupla foi feita pra caber pessoas no banco de trás, mas não foi feita para que essas pessoas entrem ou saiam de lá!" Resumindo, é um parto entrar e sair no banco de trás daquele carro. A sorte é que por ser grande acabei ganhando o banco da frente na maioria das vezes em que estava de passageiro...

Palavrinhas:

Lá ele: pra mim é uma interjeição de surpresa ou incredulidade, mas o Thomaz talvez possa esclarecer melhor...

Botar pocando: o pocar você já conhecem, mas botar pocando é o mesmo que "botar pra fuder" ou pra "ferver", como diria o KLB...

Vou parar por agora no sábado e deixar pra falar sobre o domingo mais tarde.


"Ela me deu um vale-night, ô ô Ô"; violência na TV e chuuva!


Desde a chegada do Botão à Bahia a chuva não foi grande problema, em Uruçuca não fazia muita diferença já que a gente bebeu do mesmo jeito. Quando fomos à praia - coincidência! - também não encontramos com a danada. Mas no sábado, Ilhéus só fazia chover e chover e chover. Minha tese sobre "cidade papel crepon" se confirmou outra vez e isso serve para a maioria das cidades praieiras com mais de dois séculos de existência. Quem foi ao Rio ou Salvador vai perceber que o fenômeno é o mesmo.

Enfim (lê-se anfãn), cruzamos com a bicha (xii) no sábado e que bom que foi no Trivela, pois quando a festa começa ninguém nota se há chuva, neve, merda de pomba ou qualquer outra coisa, é incrivel.

Aliás, o Botão me perguntou se havia chovido durante o show, "no que eu fui choveu", foi a resposta. Pouco a acrescentar sobre a descrição da festa, quem freqüenta esses shows é parecido no mundo inteiro. E o Asa é bom, muito bom, não tem nenhum virtuose das guitarras ou grandes vocalistas, mas me parece que a banda tem a fórmula ideal para animar uma festa. O espírito das pessoas que estão lá também contribui muuuito.

Como a gente se perdeu (duas vezes), resolvemos curtir à nossa maneira e ficamos com poucos casos em comum para comentar. Essas festas em Ilhéus sempre são engraçadas pra mim, pois encontro pessoas que não lembram do meu nome ou de mim e quando reconheecem emendam um "pooooooooorrrrrrraaa, você tá diferente pa caraalho!" e dessa vez não fugiram à regra. O bom é que pude me desculpar com alguém a quem devia escusas há uns nove anos e vi um grande amigo de minha irmã na época da escola e que, por tabela, se tornou um grande amigo meu também. Além de primos, conhecidos, etc.

Quanto ao vale-night, eu e o Botão conhecemos uma menina que usa vale-night. O detalhe é que ela e o namorado estavam na mesma festa quando o acordo passou a vigorar e invariavelmente eles devem ter se encontrado durante o furdunço. Querem saber se deu certo? Lóógico! Esse negócio de ciúmes tá virando passado.

Trocando em miúdos: "Lá ele" é similar a "Deurmelivre", "vôte", "cê tá doido?", etc. e há o adicional de "oxi, lá ele!". Os baianos estão lendo podem me ajudar, acrescentem aí nos coments.

P.S.: Ouçam Leoonii, "Alice não me escreevaaa, aquela carta de amoorr" e por aí vai. Botão falou em "Táxi Lunar", mais Geraldo Azevedo, e Asa de Águia (WHY NOT?). No próximo comento sobre o DOC, ficou grande demais.

P.S. 2: Eu quero deixar claro que além dos familiares que coloquei no texto "viva o povo baiano" existem outros que amo igualmente, como tio Nado, tio Harley e tia Ivana. Amo meus primos e amo demaaaaaaiiiiiiisssss meu sobrinho e afilhado Enzo, que ainda não me ensinou muita coisa, uma vez que só fala "mamãe e papai", e ainda assim nos momentos de maior apelo.

Um beijo e um queijo.



sexta-feira, 16 de julho de 2010

Quero não, obrigado!




A manhã de ontem começou muito mais cedo que o normal. Acordamos às 4h pra sair de Ilhéus às 5h. Pegamos estrada rumo ao extremo sul da Bahia, numa viagem de pouco mais de quatro horas até Porto Seguro. O trajeto, cortando a espessa neblina da região montanhosa, nos levaria da região cacaueira, onde ficam todas as cidades de que falamos até agora, até a costa do descobrimento, onde ficam cidades como Eunápolis, Porto Seguro, Santa Cruz Cabrália, Trancoso e Arraial D’ajuda.

Deixamos Volney no assentamento Terra à Vista, próximo a Camacan, que fica pouco depois de Itabuna, vizinha de Ilhéus. Falando em assentamento, a região é povoada deles, assim como de acampamentos do MST, que é bastante forte por aqui.

A BR-101 – rodovia federal que vai do Rio Grande do Norte ao Rio Grande do Sul, e de que faz parte a via Dutra, nosso caminho para o Rio de Janeiro – só tem uma pista de ida e uma de volta, como as outras estradas que conheci por aqui. A mudança de regiões que falei foi bastante ilustrativa no caminho. Enquanto Cinira me explicava que a região do extremo sul tem como bases da economia a pecuária e as plantações de eucalipto, a neblina que tomava conta daquela região montanhosa deu uma trégua, como num estalo, e pude perceber a mudança imediata de paisagem ao ver de um lado uma floresta de eucaliptos e do outro uma grande área de pasto.


BR-101: pista simples e vista privilegiada

Ao chegar a Porto Seguro, deixamos Cinira em Coroa Vermelha, onde ela daria o curso para os índios de uma tribo Pataxó e voltamos para Taperapuã, a praia mais turística da cidade, para escolher uma das barracas para ficar. Sentamos no Tôa-Tôa, a mais badalada. O movimento de pessoas era pequeno, típico de inverno na praia, ainda que o clima fosse de verão, sem uma nuvem no céu e com muito sol e calor.

Aos poucos o clima de inverno foi sumindo e muitos turistas começaram a chegar. Já não tinham mais mesas disponíveis ao nosso redor e as pessoas já começavam o processo de colocar toalhas e cangas no chão ou em cadeiras mais próximas do mar (o que nos deu visão privilegiada de duas catarinenses que olha... Bom, melhor deixar vocês verem, afinal o garçom que ficou nosso amigo tirou foto delas fingindo que era da gente). Junto com os turistas que acordavam tarde chegou também o povo que comanda o palco da cabana, o DJ que comanda o som e a companhia de dança que ensina a galera. Já tinha estado em Porto antes, e a diferença do que vi ontem para o que vi no verão não era tão grande viu...


"Essas mulheres não são de verdade não", Volney

O problema é que com todo esse movimento, chegou também o movimento que mereceu destaque no título desse texto, os ambulantes. “Quero não, obrigado”deve ter sido dito por nós umas 1.342 vezes no tempo em que ficamos sentados ali. Tatuagem de Henna, trança, tererê, ostra viva, artesanato, óculos escuros, empadas, camarão no espeto, queijo coalho, tudo com as mais criativas táticas de convencimento.


Bora fazer o passeio de Banana aí moral?

O cara da tatuagem de Henna pegava no braço e dizia “vamos botar um tribal nesse braço forte patrão?”, ou então “me deixa só mostrar meu trabalho aqui...”, os da ostra faziam boas brincadeiras, que iam do velho “precisa de um Viagra aí?” ao inusitado “já chupou uma coisa viva?” e os dos camarões no espeto diziam que estava fresquinho, assim como as tias das empadas, mas os mais engraçados eram, de longe, os das tranças. Thomaz, com seu cabelão e seu Ray Ban, foi chamado de empresário umas três ou quatro vezes (o que por sinal nos levou à questão de quem seria eu: um gigolô, um segurança talvez?), e teve um cara que chegou e disse “e aí Maradona, bora fazer esse cabelo?”. Firmes, resistíamos com a frase do título.

Almoçamos casquinha de Siri e batata frita, acompanhados da Brahma (sim, lá tinha bastante) que apreciamos durante toda a manhã na mais paulista das cidades baianas. Enquanto isso, paulistas, mineiros e gaúchos aprendiam a dançar axé na pista atrás de nós com um professor da casa. O professor, por sinal, dominou a cidade com seu DVD que ensina os passos. Não dei muita importância enquanto ele anunciava a venda, de cima do palco, a R$ 10. Só soube mesmo do que se tratava quando chegamos à famigerada Passarela do Álcool, à noite, e só via na TVs das barraquinhas de CD e DVD pirata os mesmos carinhas de short de axé verde limão dançando Rebolation.



Galera, agora vou tocar pra vocês uma música do Parangolé...


Pagamos a conta de turista da barraca e fomos dar uma volta pela cidade esperando a hora de buscar Cinira. Comprei alguns presentes e uma Folha de S. Paulo que não li (mas o Thomaz leu) porque, ao chegar à pousada eu só queria saber de dormir, afinal não consigo dormir em carro (porque geralmente não caibo) então tava em pé direto desde às 4h da manhã. Capotei até a hora de sair pra jantar, quando aí comprei mais presentes, uma camiseta pra mim e um sorvete na sorveteria do coelho anão.

Vida difícil, realmente muito complicada...

No caminho para a pousada, que ficava em algum lugar misterioso – sério, nos perdemos TODAS as vezes em que procurávamos por ela pra voltar -, saímos na avenida um pouco antes de onde gostaríamos. Para chegar no lugar certo era necessário fazer um retorno ou, como de costume em todo lugar no Brasil, passar por cima das tartarugas e cortar no lugar proibido. Todos concordaram que dava pra ir depois que o paulista aqui disse “ah, não deve ter guarda aqui”. Foi passar sobre a tartaruga e ver a porra do guarda mandando encostar! Cinira deu uma de João-sem-braço, disse que não sabia que não podia e o guarda disse que ia ficar só na instrução. O detalhe é que, por pura sorte, a carteira dela tinha vencido há apenas 11 dias, o que ainda dava a ela o direito de usá-la. Dezenove dias depois e o carro teria sido preso...

Passados os percalços, fui dormir com aquele ardor gostoso de quem tomou sol irresponsavelmente nas costas e a sensação de estar em Porto Seguro no verão.
Cinira nos acordou antes do café da manhã da pousada ser servido para levá-la onde ela daria o curso novamente. Voltamos, comemos e dormimos até quase meio-dia. Sim, capotamos e não fomos pra praia mais. Parte disso é vagabundagem nossa, claro, mas a outra parte é a mais pura verdade sobre a cidade: a praia é maravilhosa? É, claro, mas nada fora do comum, nada que eu não encontre em São Paulo e, mais que isso, que já não tenha visto melhor, como em Serra Grande, para não ir longe no exemplo.


Quando tomamos coragem de levantar da cama fomos ao Centro Histórico. Concordamos em não contratar o guia turístico, que para um casal (que é como Thomaz e eu seríamos caracterizados pelo tarifário), custava R$ 26. Quando descemos do carro, no entanto, ele começou a falar e nos levar pelo lugar. Como típicos turistas, acompanhamos o cara até o fim e depois ouvimos ele dizer o preço. Bom, pelo menos ele não cobrou cachê pra aparecer no vídeo que fizemos e que vai pro YouTube (e vem pra cá) assim que formos a uma Lan House novamente. (Como postamos da casa de Ilhéus e usando a conexão do celular, melhor não tentar colocar o vídeo agora...)


Primeira cadeia: paredes com 1m de espessura!

Vimos as primeiras igrejas, a primeira cadeia, a pedra fundamental, o mirante, enfim, tudo que turista tem direito. Comi em Porto Seguro meu primeiro acarajé vendido por uma baiana caracterizada, e que delícia de acarajé! Foi o melhor que comi até agora, mas o sabor e a fantasia da baiana têm preço, a iguaria me custou R$ 5, o que é mais de 100% mais caro que a média, como já sabe quem acompanha esse blog desde o começo...


O guia nos mostrou as casas, que são todas tombadas como patrimônio histórico, e explicou coisas interessantes sobre elas. Cada uma tem uma cor diferente porque isso de colocar número nas casas é uma coisa mais recente. No início eu te diria que moro na rua X na casa vermelha, e não no número 50, e mais, casas da mesma cor pertenciam à mesma família. As casas foram passadas de geração em geração e, quem não se desfez delas antes de serem tombada e a cidade virar turística se deu bem: Malu Mader, a família de José Serra e Gilberto Gil estão entre os nomes que compraram, a preço de ouro, uma daquelas casinhas.


A "casinha" de um turista americano, vizinhança pobre, coitado..

De volta a Ilhéus, agora é esperar o show de amanhã, aquele do suspense todo. A festa, tradicionalíssima, chama-se Trivela, e é promovida pelo Asa de Águia. Já estamos com a camiseta da festa em mãos, agora é curtir!

Ah sim, e como o baiano sempre diz que Porto Seguro é a cidade menos baiana da Bahia, hoje não aprendi nenhuma palavra nova do baianês. O conhecimento do dia viria das palavras eira e beira, se eu não tivesse aprendido isso na escola. O lance é que a casa do delegado lá no Centro Histórico tinha tribeira, e disso eu nunca tinha ouvido falar.. haha



Praia Fake, galera fake e uma baiana de verdade

Eu não sou um grande fã de Porto Seguro, quem me conhece em São Paulo sabe que eu sou da opinião de que essa é a menos baianas de todas as cidades da Bahia. O que não quer dizer que não tenha curtido ir pra lá, tomar aquela cerva na praia, ser confundido com turista o tempo todo e ser chamado de Maradona por um ambulante. Aliás, o tempo inteiro eu e o Botão mais cabeçudo da terra temos discutido o que nós podemos parecer pra essa galera nos lugares, ríamos com a impressão de casal gay que poderíamos passar, mas depois de encontrarmos com um casal genuinamente do gênero na praia concluímos que não parecemos (nem de longe!) homossexuais em lua-de-mel.

Voltando a Porto, a sensação que tenho é que tudo ali é uma engambelação absurda, no sentido de artificialidade da coisa. Aquele povo dançando no palco, um bando de gente te oferecendo qualquer coisa pra comprar, um monte de índio branco, preto e até amarelo, mas vermelho mesmo é um ou dois.

Trocando em miúdos, adorei ter ido a Porto, mas não escolheria a cidade para definir como um local da Bahia, é uma cidade festiva, cheia de gente bonita, repleeeta de história, mas sem identificação com o estado que este blog visa discutir. Porém (ah porém!), foi lá que vimos a nossa primeira vendedora de acarajé vestida de baiana, talvez por uma exigência, talvez por jogada de marketing, mas o fato é que foi a primeira. E nem era uma caracterização completa, era só o turbante e uma saia, a blusa mesmo era normal.

Considero uma pena que isso tenha acontecido, pois na minha infância era comum ver baianas comandando as bancas; paciência, ninguém é obrigado a cultuar uma religião em nome das vendas, exceto em Salvador, pois para não descaracterizar a imagem do acarajé os vendedores são obrigados a usar o traje ligado à religião africana.

Um fenômeno que me incomoda, e muito, é o tal do "Acarajé evangélico", pois é. Aqui tem uma galera que põe esse nome no alto da barraca e isso atrai clientes, notei até minha mãe (evangélica, mas não é nem de longe radical com religião. Verdade) dando certa preferência a uma banca que levava a etiqueta sagrada. A sensação que dá é que existe um prazer em formar guetos, acarajé não fala, não pensa e nem tem religião! No passado era uma oferenda aos santos africanos, mas não é uma receita ensinada por um orixá, é somente uma comida e ponto.


Bom, pra mim já deu desse papo cabeça, eu tô aqui pra comentar e cornetar, portanto retomemos essa árdua tarefa. Nos últimos dois dias aprendi ou conhecí tanto quanto o Botão, portanto não tenho grande moral para resenhas mais fortes. Enquanto isso um beijo e um queijo para todos.

Ouçam "La belle de jour" de Alceu Valença, tudo de Geraldo Azevedo e nunca, nunca procurem a versão de Zé Ramalho para Bete Balanço, Cruzes!

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Cultura em Ilhéus

Ontem acordamos na hora do almoço, aquele que seria na casa de dona Mirinha, a outra avó do Thomaz, mãe de Volney. No cardápio, carne de sol e pirão de leite novamente, um delicioso pudim de sobremesa, e a novidade do dia: galinha ao molho pardo. Maravilha!

O engraçado desse prato foi que anteontem tinha ouvido a história, da boca de Dr. Ronaldo, desse prato que me aguardava no almoço. Cabe contar a vocês: o filho dele, Ronaldinho, tio de Thomaz que ainda não conheci, quando morava em São Paulo, decidiu fazer a tal galinha para o pessoal que morava na república dele. Lá estava ele fazendo o molho pardo quando, ao misturar o sangue da galinha (base do molho), com vinagre, obteve um caldo negro, cor que tem o molho quando pronto. Eis que um dos que moravam com ele, ao ver o milagre da mudança de cor, saiu gritando "macumba, macumba!", e não houve jeito de fazê-lo comer a galinha. Olha, azar o dele, porque é realmente boa!

Ficamos com dona Mirinha assistindo a um capítulo "inédito" de Sinhá Moça, como diria Galvão. Soubemos que a vinda pra Ilhéus tinha sido cancelada, porque a casa ainda não tinha fogão. Mas pra que eu e Thomaz precisamos de fogão? Viemos pra cá apenas nós, de carona com um colega de Volney.

À noite, minha primeira experiência com moto-táxi, porque estávamos atrasados para o teatro, beirou o desastre. Se minha cabeça fosse apenas proporcional ao corpo, já seria grande demais pro capacete. Mas ela faz ainda questão de ser um pouquinho maior, e só conseguia ver por metade da viseira daquele capacete que, se eu caísse de cabeça, não protegeria nada. Fui na garupa do menor dos motoqueiros, e Thomaz na outra. Não tenho costume de andar de moto, a última vez que andei deve ter sido há uns bons anos. Quase tive cãibra de segurar naquela garupa. Sorte que foram poucos os minutos de horror.

Passada a experiência traumática, fomos à Casa dos Artistas, o Ponto de Cultura que comentei. No teatro popular, ontem era dia de Teatro a 2, em alusão aos R$ 2 que custava a entrada. A peça Teodorico Majestade - As Últimas Horas de Um Prefeito, do Teatro Popular de Ilhéus, grupo residente da Casa dos Artistas. Soube agora, ao procurar na internet que a peça, escrita e dirigida por Romualdo Lisboa, é apontada como responsável por revolucionar o teatro daqui, já teve temporada em Salvador e vai ainda esse ano ao Rio de Janeiro.

Lá fora, o cartaz do espetáculo. Coisa de primeira

A comédia fala de um prefeito corrupto, Teodorico Majestade, que rouba aos montes na cidade fictícia de Ilha Bela, sempre com a desculpa de querer recuperar o dinheiro investido na campanha, recheada de compra de votos, como se a reivindicação fosse legítima.

Cabe aqui comentar o Ponto de Cultura em si, que é muito parecido com os de Piracicaba. O tipo de gente que freqüenta é muito semelhante, formado por estudantes, artistas, jornalistas, professores e interessados na cultura em geral. Apesar de apresentada exaustivamente por aqui, a peça encheu os 50 lugares do teatro, e a qualidade do grupo e da casa são realmente impressionantes.

Como em Piracicaba, finalizado o espetáculo várias pessoas foram cumprimentar os artistas, que são locais, como percebo acontecer em todas as apresentações em palcos mais alternativos que já vi. Concluí que a gente ligada à cultura tem rosto parecido em todos os lugares, e quando comentei isso com o Thomaz ele acrescentou rindo: "com pequenas variações no bronzeado..."

Do teatro, fomos ao Vesúvio, aquele que coloquei foto no dia da visita turística em Ilhéus. Por lá comemos bolinhos de queijo, charque (carne-seca), bacalhau, e quibes, além de derrubar uma torre de chopp, neste que foi o primeiro lugar em que comi/bebi por aqui e me cobrou preço de turista, já que em Uruçuca era tudo muito barato. Bela noite ao som de músicos também locais, que tinham repertório com músicas realmente muito boas, como Alceu Valença, Geraldo Azevedo, Belquior, e aquelas músicas que sempre tocam em bar, e a estranha mania de começar as canções pelo refrão.

Saindo dali, mandamos um sorvete Cruz Vermelha no Ponto Chic e voltamos caminhando pela praia, não sem antes sentar um pouco na areia para admirar a brisa. Noite agradabilíssima. De volta ao apartamento, terminei Pastores da Noite, em que Jesuíno Galo Doido morreu, e comecei a ler O Anjo Pornográfico, e descobri que, embora não dê pra comparar, o Ruy Castro é gostoso de ler como o Jorge Amado. Ah sim, antes de dormir ainda perdi pro Thomaz no xadrez duas vezes, em um jogo disputado e uma lavada.


Thomaz e o Cruz Vermelha

Agora estamos de boréstia aqui por Ilhéus, e vamos à noite ou amanhã cedo pra Porto Seguro, onde a mãe do Thomaz vai dar um curso para uns índios em Coroa Vermelha. Devemos ficar na cidade até sexta. Pra quem não sabe, de boréstia é o mesmo que de boa, e é a expressão baiana do dia. Com ela acrescento que o povo aqui fala muito "véi", que deve ser minha mania por um tempo depois que voltar, e que é costume chamar os outros de "moral". Do tipo: "Vamos pra onde moral?" (moto-táxi), ou "Tem um trocado aí moral?" (pedinte).

Agora tou ouvindo Cartola na Lan House enquanto escrevo a postagem. Tá um dia lindo lá fora e acho que vou tirar foto da praia enquanto o Thomaz escreve o cometário dele, pra vocês saberem do que tô falando...

A praia ao lado da Lan House, fotografada enquanto era escrito o comentário abaixo

Beijos


Um "banho de civilização" em Ilhéus (por Thomaz Fernandes)

Já havíamos visto o anúncio da peça e queríamos vê-la sem mesmo sabermos exatamente do que se tratava. Além do que o mais jovem entre os Botões disse sobre a história, pude identificar uma crítica ao ex-prefeito de Ilhéus (Ilha Bela), Valderico Reis (Teodorico Majestade, rá). Apesar de um tanto engajada, foi fantástico notar que ela pode ser apresentada a todos, mesmo os que não conhecem a história (haja vista o post do Botão).

Ontem conhecemos uma mulher que era surda e recuperou a audição por meio de prótese, eu falava com ela enquanto Iuri acompanhava ansiosamente o plano de Sinhá Moça para invadir a senzala da fazenda Araruna com o Irmão do Quilombo, rs.

Ontem conversávamos sobre a delícia que seria morar em Ilhéus, enquanto andávamos na praia da avenida. Uma pena que o lugar não oferece muito espaço para jornalismo, seria ótimo transformar aquela paisagem em cotidiano novamente e ganhar uma grana e sentir tesão profissionalmente.

Eu sempre tive um pé atrás com relação a Ilhéus no sentido de vida cultural, mas ontem tive a melhor impressão possível, pois curti um som gostosíssimo, vi uma boa peça que encheu a sala em plena terça-feira chuvosa que tivemos.

A frase mais dita ontem era: "Faltava aqui um par de costelas", maneira singela de dizermos que o lugar seria muito romântico caso houvesse presença feminina.

Além de fogão, a casa ainda não tem TV e ficamos ouvindo a rádio daqui, Gabriela FM, o programa que passava era "LLLooove Sooongs" e enquanto eu detonava Iuri no xadrez, ouviamos Gisele do bairro Conquista dizer para Marcos do Princesa Isabel que ela respeita "a velocidade com que as coisas estão indo, mas preciso de uma aproximação mais íntima, quero penetrar no seu peito", praticamente uma bala de fuzil.

Enquanto ele mata o pobre Jesuíno Galo Doido, leio "o Homem nu", de Fernando Sabino e "O livro dos sonetos" de Vinícius de Morais.

P.S.: Ouçam Gerônimo (o Botão curtiu) "É d'oxum", "Hotel California" e assistam ao documentário L.A.P.A, que eu assisto pelo Youtube enquanto o Botão escreve.



segunda-feira, 12 de julho de 2010

Viva o povo baiano!




Hoje o dia foi de preguiça e leitura. Acordei com a ligação do Marcelo Rocha no meu celular, umas 10h30 que ele sabe que não gosto de acordar cedo. Li Pastores da Noite pelo resto da manhã e fiz o mesmo depois do almoço, não sem uma pausa para ouvir de Zangado (aquele que é amigo da família e motorista do Dr.) alguns casos. À tarde o Thomaz recebeu do avô a tarefa ingrata de conseguir a cópia digital de um documento que só tinha impresso. As saídas eram digitar tudo de novo ou buscar na Prefeitura, e o Thomaz já me adiantou que seria demorado. Li um pouco e depois capotei, pra só acordar às 18h.

Falando nisso, no livro (que devo terminar agora à noite), já teve solução o caso de Martim, Marialva e Curió, também negro Massu se tornou compadre de Ogun. Falta agora a solução do caso do morro do Mata Gato pra eu conhecer a história toda e começar minha próxima leitura, que ainda não sei se será O Homem Nu, de Fernando Sabino, ou O Anjo Pornográfico (biografia de Nelson Rodrigues), de Ruy Castro.

Como a história do dia se resumiria a isso, vou me dedicar hoje a falar das pessoas. Não pessoa por pessoa e nome por nome, para não correr o risco de deixar de fora figuras importantes. Ao contrário, vou tentar falar de forma genérica sobre as minhas impressões que foram comuns sobre quem conheci e que acredito serem características comuns ao povo daqui. É já que vocês vão entender do que estou falando.

Primeiramente vale comentar sobre a família. Todos os baianos que conheci foram receptivos, mas esses que me cederam pousada são especialmente dedicados. Nas refeições fazem questão de contar a história do que estou comendo, comparar com outras comidas. Além de falar, a comida em si já é um agrado: todo mundo se preocupa que eu tenha acesso à tão variada culinária daqui, e que me sinta em casa para "merendar" a qualquer hora, como me disse hoje dona Marlene, a avó, uma das que mais se empenha para que me sinta em casa.

Os pais, Cinira e Volney, que pouco vejo porque trabalham demais (e não tem nem domingo direito), me incluem mais que tudo. Fazem planos em que estou envolvido, levam no restaurante para conhecer o caranguejo e fazem das refeições deles as minhas para eu experimentar sempre algo novo.

As próximas duas características da família são também do resto do povo. Todos por aqui gostam de contar casos. Claro que isso deve ser uma característica dos brasileiros, impressionante como todo mundo gosta de histórias, mas por aqui é frequente ouvir histórias do pessoal, que envolvem política, futebol, experiências amorosas e familiares.

O maior representante do gênero? Dr. Ronaldo, que principalmente na hora das refeições mas também às vezes depois delas, pergunta se já ouvimos falar de alguma coisa e, com resposta negativa, se põe a explicar, abre um parêntese e conta um caso, uma experiência, claramente orgulhoso do que viveu e de tudo quanto pode compartilhar. E isso vai de experiências a pontos de vista. Nextante mesmo, acabei de jantar e ouvi na mesa mais um tanto de casos dele, coisa da época de ginásio, da década de 40, que ele se lembra com riqueza de detalhes. Isso de conviver com os avós dele, por sinal, faz um bem danado pra mim que nunca vivi muito essa coisa de casa da avó, já que os meus se foram muito cedo.

E já ouviram falar daquela história de que "amigo do meu amigo é meu amigo"? É essa a segunda característica, que mais do que tudo vale por aqui. Comecei a perceber pela família, que me trata mesmo como se fosse um membro dela, e confia: falam de tudo na minha frente, organizam passeios e/ou viagens incluindo mais um e, como Thomaz não tem carta, quem dirige o carro sou eu. E isso tudo começou antes de me conhecerem. Basta o fato de ser amigo de Thom (apelido dele aqui, afinal num dá pra ser "baiano", né? Este parêntese foi escrito pelo próprio).


Tem moral esse Thom, viu?

Isso de eles me incluírem na família vai me fazer querer voltar mais vezes. E na próxima não vai ser pelo turismo, mas para visitar essa galera toda por quem já tenho enorme apreço.

O mesmo acontece com os amigos. Comecei a comentar isso com o Thomaz quando ouvia abertamente o pessoal falando de qualquer coisa comigo junto, e me incluindo no papo. Esse "qualquer coisa" ainda não é suficiente para explicar: batendo uma resenha na praça, comendo água (Schin ou Skol, tanto faz) na companhia de belas mulheres e homens muito gente boa, ou mesmo aqui na casa, na varanda, conversando com menos gente, o assunto foi mais de uma vez para papos íntimos, seja falando de sentimentos e contando segredos, ou falando de sacanagem mesmo.

O primeiro bom papo na praça, na sexta-feira

Na hora só conseguia imaginar a situação oposta: eu falando com uma grande amiga sobre intimidades e ela me cutucando ou olhando com uma cara de "ei, vai falar isso na frente dele?", se referindo a um estranho na roda. Aqui isso não aconteceu sequer uma vez. Falei disso com Thomaz e com algumas pessoas em uma dessas rodas de conversa. A resposta foi sempre a mesma: "você não é amigo de Thomaz? Então pronto".

Claro que não se pode generalizar, como em qualquer grupo de pessoas a quem você se refira. Tanto por aqui tem gente mais tímida quanto em São Paulo tem gente que confia mais e fala mesmo. Mas se isso não se pode generalizar, algo que se pode é que o povo aqui leva a sério isso de comer água. Quando saem pra beber, é só o que eles comem MESMO! Não tem essa de porção de fritas com queijo, lanche, frios... é só bebida! Rompi a tradição ontem, quando comi um churrasquinho na praça, afinal to acostumado a um tira-gosto com a cerveja.

Experiência engraçada também foi, enquanto conhecia tanta gente legal, ler Jorge Amado. Os personagens que ele descreve e que leio já há vários anos são muito parecidos com os que fui conhecendo por aqui. Antes, tinha a impressão de que ele falava sobre um universo que, se não era completamente ficcional, era referência apenas aos malandros, aos moradores do cais, típicos personagens dele. Não, descobri aqui serem a simplicidade e a conversa fácil características dos baianos todos, pelo menos da maioria que conheci.



Sábado, no aniversário da Helen (essa de marrom, embaixo). Ela tava com o pé pocado, e engessado, mas andando pra lá e pra cá.

Peraí. "Fácil" não é exatamente a palavra pra conversa. Estamos acostumados com Thomaz e com baianos da TV que falam sempre devagar, certo? Muita gente por aqui fala o baianês assim mesmo, compassado, como a família toda aqui e outros amigos. Alguns, porém, falam numa velocidade que é difícil de entender. Os maiores exemplos são Jacó, um dos amigos, e Raimunda, de quem já falei uma vez. Conversar com eles requer prestar primeiro atenção à forma do discurso, para depois interpretar o conteúdo. Se bem que agora já me acostumei mais com isso, já que conversei um tempão com Jacó.

Em um post desses anteriores o Thomaz disse que nunca precisou fazer sala pra mim. De fato. No primeiro dia ele fez questão, acho que por educação, de estar sempre comigo nas rodinhas. Hoje isso ainda acontece, claro, afinal estamos sempre juntos e os papos são comuns. Mas o fato de ele falar reservadamente com alguém, ir ao banheiro, buscar uma cerveja, ou não estar por ali por um motivo qualquer, nunca me deixou constrangido ou tímido. Sempre vem alguém falar de alguma coisa, perguntar ou contar da vida, de assuntos que vão de escola/faculdade/trabalho, a amigos/namoradas.

Entre as galeras que encontrei no fim de semana, cabe destacar os que acabo de classificar como os onipresentes, gente que tava ali sempre e nunca recusou um bom papo e comer uma água. Além de Jacó, estão nessa lista Alano, que ainda tá devendo o almoço dos jornalistas - pra ele, Thomaz, Fernanda e eu -, Fernanda, Lorena e Anne. É engraçado que nessa galera estão reunidas diferentes gerações da cidade: o Alano (o farrista da foto, que comenta no blog e enriquece meu vocabulário) era da galera de Karol, que é 8 anos mais velha que a gente; Lorena, Fernanda e Jacó são da nossa idade; e Anne (a outra da foto) tem 17, idade do meu irmão.. Gente formada na faculdade, com ela em curso, ou ainda no colégio, tudo junto e misturado!



Anne e Alano, onipresentes, mostrando a Brahma Fresh

Disse que não o faria, mas cabe citar aqui outros que valeu a pena conhecer e ainda não entraram no blog. Se encaixam aí Décio, Helen, Monicão, Peu, Taliane, Hortênsia, Ana Bárbara, Julinha (prima do Thomaz)... (Tem o Lebrão também, amigo do Thomaz que me deu vinho a noite inteira outro dia, o Thomaz me mandou ter cuidado pra não ficar bêbado, mas sem problemas) Todo esse povo porreta certamente valeu a pena conhecer.

Pra terminar, já que hoje eu disse que o texto seria mais curto, seguem novas palavras:

Queixar (quêxar) = xavecar

Missi = grampo de cabelo. O melhor foi a frase em que conheci a palavra, com Anne contando que descobriu na infância que dava pra abrir com isso o cadeado de sua casa...

Trançado = que não vale nada, descarado, malandro, e tantos outros sinônimos. Pode ser ruim ou bom, e pelo contexto se entende...



Murissóca = mosquito ou pernilongo. Não que a gente não conheça a palavra, mas vale dizer que eles só chamam assim. Aliás, não precisa chamar não viu, elas vem sozinhas, e aos montes, tomo umas 10 picadas por dia!

Carritché = O Thomaz me disse que é rasteira, escorregão, por aí vai....


Falando do próprio umbigo (por Thomaz Fernandes)

Desde que eu fui morar em Piracicaba, sempre que falta um mês pra voltar pra casa de férias os sintomas são sempre os mesmos. Sem perceber eu começo a ouvir música baiana com mais frequência, fuçar o Orkut dos amigos que tão aqui, ficar inseguro para ouvir da família coisas que invariavelmente circulam entre cabelo-barba-peso-bebida-horários-cabelo de novo (coisa de mãe, avó, pai, irmã e amigas que se chamam bisquí etc.) e o frio na barriga me acompanha até entrar no avião. Em todos esses anos a volta é igualmente parecida, o sotaque volta mais forte, novos ditados, novos sons, fico mais irreverente, mais leve (psicologicamente).
Esse parágrafo ilustra um pouco o que chamo de recarregar as baterias, trazer de volta uma espécie de "brilho nos olhos", que vão ficando apagados conforme os meses em Pira vão passando. Não significa, nem de longe, que eu seja triste em Piracicaba, pois vivo muito bem nesse lugar que escolhi (ou fui escolhido) pra viver, mas é fato que em algum momento as raízes falam alto e eu preciso desse momento.

Iuri tem visto aqui, muita coisa que era atribuída somente à minha personalidade, pois de fato o é. É em meu pai que me espelho, dentre outras coisas, na hora de fazer piadas, ouvir o que todo mundo tem a dizer e desenvolver o máximo de argumentos possíveis para meu ponto de vista; em minha mãe na paciência, por muitos desconhecida, em executar as coisas e na simplicidade em falar de coisas amenas em meu avô Ronaldo e minha vó Marlene vou buscar histórias e informações em tudo que é lugar e amanhã ele conhecerá o outro lado da família, que me ensina muito a ser passional, risonho e festivo. Claro que nesse povo aí tem muito defeito e que na família tenho uma irmã que Iuri não vai conhecer dessa vez, que é a exata definição de uma irmã mais velha nas milhares de virtudes e nos vícios também.


Fora do ambiente familiar o mais jovem entre os Botões viu muita gente da minha galera, que me ensinou demais a perder o mimo, a brincar e me soltar no lugares, a não ficar grilado. A fonte da minha espontâneidade nas conversas picantes ou piadas sujas é visivelmente encontrada nos papos com todos, sobretudo com as meninas mais chegadas (até por quê é o que elas me falam que me interessa nesse assunto. Vivendo e aprendendo), que me respondem absolutamente TUDO que eu perguntar.

Na cabeça do baiano (isso é um generalismo) não há tanto grilo com relação a gente nova, por isso ele está sempre à vontade, a salvo um ou outro que chegam com malícia é todo mundo muito verdadeiro, pro bem ou pro mal.


Apesar de não ter planos para morar aqui tão cedo, é aqui que volto a ser do meu jeito, que me sinto na sala de casa mesmo em lugares formais. Amo Pira, assim como as pessoas que tão bem me fazem desde que pisei lá, mas a gente pode ter mil mulheres, mãe só tem uma e a Bahia é a minha.


P.S.: Ouçam Três Meninas do Brasil, demais, e também prestem mais atenção a sambas antigos, Já ouviram Cartola? E Cazuza cantando Cartola?

P.S. II: Para os que duvidam de que eu cortei o cabelo é só olhar nas fotos acima e comparar. Na que eu tô de blusa escura ele cobre o brinco, que pouco aparece, na de camisa clara ele é nítido, compara aí, ééééé. Fiz a barbaa, aleluuuia!



domingo, 11 de julho de 2010

Fim de semana Uruçuquense e turismo em Ilhéus


Com vocês, a Nova Schin da Bahia!


Rapaz, nessas últimas 24 horas abusei de comida tida como pesada. Ontem de manhã foi acarajé, no almoço moqueca de camarão e camarão oriental, e à noite, pra ser um pouco mais tranqüilo, pizza. De madrugada, quando bateu aquela fome pós-festa, experimentei um dos pratos mais fortes que tem por aqui, o sarapatel, mas foi só uma garfadinha pra não dizer que passei em branco. Tudo bem, vou dizer a verdade, foi também porque tava com muita fome. E olhe, é bom!
Discorrido um pouquinho sobre a comida, vou tentar colocá-los a par dos últimos acontecimentos, tarefa difícil, já que desde a sexta à noite quando escrevi pela última vez, a quantidade de fatos que se passaram seria suficiente para escrever um livro inteiro! Falando em livro, em Pastores da Noite, Curió está prestes a dizer a Martim que está apaixonado pela mulher dele, Marialva. Ô mulher que não vale nada!

Mas continuemos. A noite da sexta me rendeu as impressões que faltavam sobre as pessoas daqui. Meus conhecidos até então eram a família e um ou dois amigos. Na sexta conheci o resto todo da galera, fora algumas exceções que conheci na noite de ontem. Uma próxima postagem vai falar sobre o povo, mas não essa. É muita informação e querer misturar as pessoas com o dia de ontem vai me fazer ter de suprimir muitos detalhes.

Na sexta a noite terminou cedo. Quando fecharam os bares da praça e quase todos já tinham ido embora, nós remanescentes fomos ao Rey do Fogão. Lá encontrei pela primeira vez Brahma por aqui. Mas a novidade não para por aí: era Brahma Fresh, alguém conhece? Tomamos umas duas e voltamos pra casa debaixo de uma garoa fina.

Acordamos cedo no sábado porque Volney tinha reunião em Ilhéus e, se quiséssemos ir para Serra Grande à tarde, o caminho era acompanhá-lo. Sábia escolha, apesar de madrugar, afinal enquanto Cinira fazia o cabelo para um casamento à noite, eu e Thomaz fizemos um excelente passeio turístico pela cidade. Vou tentar ser sucinto na descrição das coisas, mas sem privá-los dos detalhes. Cabe aqui comentar também que o dia de ontem foi uma vitória para os pais de Thomaz: ele finalmente cortou o cabelo, embora o Volney nem tenha percebido.Eis o que ele disse quando entramos no carro: "Thom, não deu tempo de cortar o cabelo não?"

O início do passeio pelo Centro Histórico nos colocou de frente com um Ponto de Cultura. Acostumado a escrever sobre os pontos aí de Piracicaba, não posso deixar de ver uma peça que vai ter lá na terça. Como o ponto só abria às 14h30, começamos o banho de cultura pela Casa de Cultura Jorge Amado, palacete que é símbolo da cidade e onde o escritor cresceu e escreveu seu primeiro romance, Paiz do Carnaval.


A Casa de Cultura Jorge Amado

Na casa, que funciona como centro cultural desde 1997 – quando o escritor ainda era vivo –, estão pertences dele, um vídeo feito na época da inauguração, as capas de todos os livros, uma lojinha e, principalmente, pra mim que sou fã da literatura dele, a atmosfera de saber que foi a casa do cara.

Comecemos pela história da casa e pela construção em si. Soube ontem de um fato determinante para que Jorge Amado se tornasse escritor: o pai ganhou o dinheiro da casa, uma fortuna, em um jogo, tipo uma mega-sena dessas. A casa tem dois andares e um mirante na parte de cima, que permite ver a cidade por todos os lados, além de dar uma visão privilegiada da catedral. Como a escada é frágil, atualmente não é permitido subir no mirante. Tive que me contentar em ver a paisagem pela janela do segundo andar, que já é ótima.

Todas as madeiras da casa são de jacarandá, e até a cortina é de madeira. A explicação é que, na época, era muito mais fácil conseguir jacarandá do que tecido, que tinha que ser importado. Entre as histórias mais legais, está a da estátua do saguão de entrada, que foi feita por um artista da região e se chama São Jorge Oxossi Amado. O Orixá Oxossi, no sincretismo religioso, seria São Jorge, aquele do dragão. A obra de arte mistura elementos figurativos dos dois santos, em homenagem a Jorge Amado.

Outro elemento à parte é o contador de história, que trabalha “voluntariamente” no segundo andar da casa. Ele não trabalha oficialmente ali, então conta suas histórias e pede ao público que dê o quanto acha que vale. Ele se apresentou só a nós dois e de tão boa que foi a história e a interpretação – que passava pelos barões de cacau e o início dos cacaueiros por aqui – ganhou o almoço do dia, sobrando até pra um acarajé mais tarde...

Continuamos o passeio pelo centro passando por outros pontos que vou citar mais rapidamente. O primeiro foi o Bataclan, que no passado funcionava como cassino, casa de moças (ou castelo, como Jorge Amado gosta de chamar), e importante centro de negócios e política. Por ali passavam os intelectuais, políticos e barões da região. Também estava fechado, hoje ainda existem shows para turistas, mas só funciona à noite. Essa semana ainda passo lá.


Bataclan: jogo, negócios, mulheres...

Do puteiro fui pra igreja. Literalmente. A catedral de São Sebastião é do século passado, e muito bonita, como vocês podem ver na foto. Depois de uma pausa pra um momento de oração por ali (ao som dos pássaros que cantavam e voavam dentro da igreja), continuamos a caminhada e passamos pelo Vesúvio, um bar e restaurante muito tradicional daqui. Visitei também a igreja de São Jorge, onde os pais do Thomaz casaram, mas só por fora, porque ela está fechada.

Catedral de São Sebastião


Igreja de São Jorge

Ainda passamos pelo belo e centenário prédio da prefeitura e pela rua mais antiga da cidade, que tem calçamento dos anos 30, com paralelepípedo diferente do resto das ruas. A rua é também uma das mais estreitas. A largura limitada das ruas, por sinal, é uma característica da cidade. As ruas são todas muito bonitas e é grande o número de construções tombadas, em que dentro funcionam estabelecimentos modernos, mas a fachada ainda é centenária.

O único problema é que, com tanto conteúdo histórico, a cidade acaba ficando desorganizada demais, o que pode ser um problema se ela crescer mais em quantidade populacional, número de carros, etc. Os carros, por sinal, já são um problema. Como não há muito lugar para estacionar no Centro, os bolsões de estacionamento da avenida principal estão sempre lotados. A cidade tem cerca de 90 km de praia.

Depois do acarajé para enganar a fome, acompanhado de uma água de coco, que aqui é barata, almoçamos na Casa da Empada. Estabelecida na estrada Ilhéus-Serra Grande, lá funciona uma lanchonete, famosa pelas empadas, e um restaurante. Eles estão no Guia 4 Rodas, e não é a toa. A comida é muito boa. Lá comi a moqueca de camarão e o camarão oriental, feito como o frango e a carne que acompanham umYakissoba, provavelmente por isso o nome de oriental.

O baiano (de cabelo cortado) e o paulista, em frente à Casa da Empada, pra vocês não ficarem com saudade das nossas caras

À tarde ainda rolou um banho de mar em Serra Grande antes de voltar pra Uruçuca pra noitada. Ontem, porém, não ficamos na praça. Fomos ao aniversário da Helen, e comemos um pouco de água. A noite foi terminar em Maria Peixeira, ou Pexêra, que é como se fala, onde comprovei o que Thomaz dizia sobre Fernanda (Bisquí) não valer nada. Fernanda é uma quase jornalista, como nós, e muito, mas muuuuito gente boa. Mas veja o que ela me aprontou.

Cecílio é um personagem da cidade, pra quem conhece aí em Piracicaba, seria famoso como Saponga ou Madalena. Um negão enorme, gay (é claro!), que vaga pelas ruas. Em Maria Peixeira, veio cumprimentar todo mundo e Fernanda (ô Fernanda!), disse: “viu o bofe novo por aqui? Dá um beijo nele!”. Pra quê, lá me vem ele dar beijo no rosto. Até aí tudo bem, mas ela resolveu incentivar mais: “Ôxe Cecílio, beije direito!”. E aí tive que me esquivar pra não tomar um beijo na boca do negão. Ainda bem que eu tava ainda sóbrio...

Essa noite sim terminou tarde, e depois do bar ainda fomos ao Soca Braço, rua que tem esse nome porque lá funcionavam muitas olarias e o pessoal “socava o braço” pra fazer os tijolos. Eita lugar longe viu? Na verdade nem é tanto, é uma reta só e em Piracicaba ninguém negaria uma carona de carro. A questão é que fomos andando, que aqui quase ninguém anda de carro pela cidade, e no fim da madrugada! Enquanto íamos encontramos uma galera já acordando pra trabalhar.

To adorando isso de cidade do interior, mas a rotina deve mudar a partir de amanhã, já que os pais do Thomaz estão levando hoje a mudança da casa de Serra Grande para o apartamento onde vamos ficar a partir de amanhã, em Ilhéus. Essa, aliás, foi a primeira das confirmações pendentes que ontem se concretizaram: além da mudança, foi confirmada também a viagem (quinta e sexta estaremos em outra cidade, que depois eu conto) e a festa grande que vamos e conseguimos comprar o ingresso. Ainda não vou dizer o que é (suspense pra quem não é daqui!), mas adianto que é uma dessas bandas famosas que vai tocar, calculem pelo preço do ingresso que é coisa grande: R$ 70.

Ah sim, coisas que esqueci de falar: por aqui eu tomo leite da vaca! Não simplesmente DE vaca, como tomo aí, mas DA vaca mesmo, in natura. É bom viu?

Mais umas palavrinhas aí:

Parassé (que não sei se é assim que escreve, mas assim se fala): confusão, prezepada, ou palhaçada. Não sei se tem correspondente certo, mas já vi empregado aqui nesses sentidos.

Nextante: nesse + instante (é engraçado ouvir!)

Pocar: é estourar. Por exemplo, “fulano pocou o joelho”.

Ó paí ó: seria um “olhe pra isso”, meio surpreso. Todo mundo conhece a expressão pelo filme, mas aqui ouvi bastante. Ouvi assim mesmo, completa, mas também variações, como “ó paí”, apenas ou “ó paísso”.

Só terei folga de hoje a 15: essa ouvi do Dr. Ronaldo, dizendo pra Marlene que só poderia ir ao oftalmologista daqui há 2 semanas...

Mas a melhor mesmo é a versão deles pra “dar uma”. Não que assim as pessoas não entendam, dar uma é dar uma em qualquer lugar. Mas por aqui é comum dizer “fazer ousadia”, que na verdade se diz “ósadia”. É gostoso de ouvir também viu...

Falei também algo que eles não sabiam o que era: “na faixa”, pra “de graça”, aqui não existe.

Aí Thomaz me disse pra falar sobre duas coisas, que não são exatamente novidade, afinal todo mundo conhece, é mais pra desmistificar. Ninguém fala muito oxente. Ouvi alguns poucos, mas geralmente para no ôxe. A segunda é o tal do “meu rei”. To aqui já há cinco dias e não fui chamado nem vi alguém chamar os outros assim. Se falam meu rei na Bahia, certamente não é em Uruçuca, Ilhéus ou Serra Grande.

Só um breve comentário sobre a final da Copa: aquela deve ter sido a primeira vez que o Iniesta chutou pro gol na vida dele! O resultado é meio foda porque coroa um futebol muito água-com-açúcar, apesar de bem jogado. A Espanha fez apenas 8 gols em 7 jogos...


1º fim de semana: amor à primeira vista e muitas risadas
(por Thomaz Fernandes)

O primeiro FDS do Botão aqui foi muito, mas muito engraçado de ver. Já disse aqui que a presença dele me faz curtir também umas coisas que não são de hábito para pessoas daqui, como ir à Casa de Jorge Amado. De informações eu tinha quase todas, mas a interpretação desse contador de histórias foi muito boa, fiquei besta.

A comida pesou menos, pois a moqueca da Casa da Empada é de paulista (ou seja, tem pouco dendê), mas morri de medo da garfada no sarapatel de Maria Peixeira, afinal sempre ouvi dizer que sarapatel “é comida para se comer em casa”, foi mal Doutor Ronaldo. Como eu tava com o dobro de fome, fundei no sarapatel como se não houvesse amanhã. O bar seria considerado fim de linha em Piracicaba, mas é do melhor tipo, apesar de o apelido da dona se referir a uma arma, ela é bastante irreverente e deixa todos à vontade.

A maior vantagem de Uruçuca é que as pessoas são bastante receptivas e em nenhum momento eu precisei “fazer sala” pro Botão, pois a maioria se mostra agradável e curiosa com o meu amigo de 1,90m que veio de São Paulo. Ele surpreendeu a muitos também pela sua resistência alcoólica, é mentira que ele tava sóbrio, mas não passou da medida ou se excedeu em nenhum momento.

O melhor da noite foi o carinho de uma das lendas vivas de Uruçuca com Iuri. Pense num cara de 1,80m de altura, negão, vestindo um minishort, gay, com dois dentes na boca beijando o pescoço de Iuri. Qualquer descrição é pouco para aquela cena histórica e pra isso mandamos também uma foto da beldade.


Cecílio em sua melhor pôse

P.S.: Ontem ganhamos um DVD de uma banda chamada Onda Loka (o dono da casa que estávamos é produtor musical, Adson, muito gente boa). Num sei se é pagode, arrocha ou os dois, mas tem sucessos como Rebolation; Chora, me liga; Manteiga e Inheco Inheco. Boa sorte.

P.S. II: Ouçam Edson Gomes, Reggae baiano da melhor qualidade!!!!

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Cuidado onde pisa. E onde põe a mão!


A roça, e lá embaixo as novilhas nos olhando

As palavras do título foram exatamente as que ouvi de Dr. Ronaldo na roça. A roça, lugar que visitamos hoje cedo, coisa de 12 km de estrada de terra longe de Uruçuca, é a fazenda do avô do Thomaz, que nesse momento me advertia enquanto entrava no meio de alguns pés de cacau. Os perigos com que devia me preocupar eram cobras – e vira Thomaz e diz “sim, tem cobra aqui” – no chão e marimbondos peito-de-moça nas folhas do cacau, que tem esse nome pelo formato das casas.

Hoje foi o dia de o Thomaz nos guiar no carro: a estrada de terra é aquela mesma onde ele aprendeu a dirigir com Zangado, o motorista do Dr., que também nos acompanhou. A propriedade, que tem duas sedes, tem cacaueiros, pés de diversas frutas (das quais comi uma goiaba verde, um jambo e cacau, que merecerá um parágrafo à parte adiante).

As partes de que ele mais se orgulha, no entanto, são outras. A escola, que leva o nome da mãe dele e que ele implantou, nos idos dos anos 60 quando era secretário de educação e não havia escola por ali; além da parte da preservação: o que ele chama de “gota de mata atlântica” preservada, são 30 hectares de vegetação original da área, que tem árvores que quatro homens não conseguem abraçar. Os animais, que assim como a mata nativa não pude ver hoje, são outros pontos preservados, e Dr. Ronaldo garante que em sua propriedade existem lobos-guará, capivaras e pacas, “caças” extintas nas fazendas vizinhas.

Os tais animais não apareceram para fazer uma cortesia comigo da mesma forma que a cobra na estrada no caminho de Serra Grande (adivinha só, esqueci de contar isso ontem!). Quem sabe na próxima visita à “roça”. Coloco roça entre aspas porque é como eles chamam a fazenda, sítio ou o que for: seu pedaço de terra, por aqui, é sua roça, palavra que conhecia em São Paulo, mas que por lá tem um sentido mais pejorativo, como dizer que “o cara é da roça”, ou falar da roça de banana que se tem no quintal, mas nunca se referindo a uma propriedade rural, sei lá...

De “resenha” (ou jogando conversa fora, de um jeito animado) na praça com uns amigos do Thomaz, ouvia a galera falando do “bába” que ia rolar à noite. Bába é a nossa “pelada”, que por sinal rola agora às 19h e da qual não estou triste por não fazer parte. Pela conversa do povo, é todo mundo craque de bola!

As novidades de hoje são, como sempre, gastronômicas, já que está todo mundo aqui muito empolgado de me mostrar as coisas! Tudo bem que o Thomaz também não reclama, afinal os pratos são para ele matar a saudade e eu experimentar. Hoje o almoço foi de carne de sol - que não é o mesmo que carne-seca (ou carne de charque, o nome daqui) como sempre achei) – assada com batata. Uma delícia, que acompanhou o pirão de leite, que é um pirão, como o conhecemos, só que de leite (se bem que não sei se vai leite). É uma pasta que parece purê na textura, só que é branco e, assim como o cuscuz de tapioca, é um bom acompanhamento, já que não tem assim tanto gosto. Com a carne ficou maravilhoso.

A outra experiência foi em relação às frutas. Na roça, Zangado subiu no pé de goiaba para apanhar uma fruta que eu sabia que estava verde, e para não deixa-lo sem graça dei um jeito de comer (a dele estava ainda mais verde, ele ensinou que era só quebrar a casca que tinha uma polpa mole no meio). E subiu também no pé de jambo. Esse eu já conhecia, e não lembrava se era bom. É maravilhoso! E olha que o que eu comi não estava assim tão maduro...

Finalmente veio o cacau, que vi de tudo que foi jeito nos cacaueiros. Desde ontem ouvia falar do mel de cacau, que é feito espremendo a polpa da fruta em uma caixa que depois vocês vêem nas fotos. Eles apanharam cerca de 50 frutas pra tirar uns 2 litros e meio de mel.


Chupando os caroços de cacau. Ainda bem que é legenda de foto, senão dava pra pensar outra coisa...

Com o copo na mão ouvi do avô de Thomaz: “presta?”. Respondi: “Ô, muito bom!”. De fato, é muito bom mesmo. Tomei um copão e lambi os beiços. Ouvi do baiano que é meio indigesto, espero que não! Aliás, agora no café devo tomar gelado, que deve ser ainda melhor, e vou experimentar o cuscuz de milho deles aqui.


O processo de tirar o mel do cacau


E a secagem do fruto no sol (isso aqui também é cultura!)

No livro Pastores da Noite, cabo Martim já está de volta a Salvador, e tá todo mundo revoltado com Marialva. Sim, leio aqui, entre um cochilo, uma cerveja, uma praia e uma resenha.

Escrevendo agora nesse começo de noite, só tenho a dizer, parafraseando os baianos, que “tá um calor da porra!”. Resolvemos postar hoje mais cedo: na hora de voltar provavelmente não vamos querer escrever. Começa hoje o primeiro fim de semana, vamos comer água um pouquinho! Pra mim a expressão não é nova, mas pra quem não sabe, é tomar uma...

Saudades de vocês, beijos!



Mulheres são de Vênus, homens de Marte e paulistas de Júpiter
(por Thomaz Fernandes)


Essa ao menos é a sensação que as pessoas têm quando vêem um na Bahia, é engraçado ver o motorista e amigo de meu avô (o zangado) mostrando tudo pra Iuri achando que ele nunca viu na vida. Como há muita novidade pro mais jovem entre os Botões, até da galinha Zangado mandou tirar foto (“vá, tira aí e mostra em São Paulo que você viu uma galinha!”).

É divertido na hora de comer ou de mostrar coisas pouco habituais em São Paulo, como a quantidade de Mata Atlântica e tal, mas o melhor é ver Iuri tentando acompanhar raciocínio nas conversas. Depois de uma hora de conversa usando a expressão Bába pra futebol, ele vem me perguntar se era mesmo de futebol que a gente tava falando.

E o povo daqui tá metendo-lhe comida goela abaixo, se continuar assim dona Rose (mãe dele) vai ficar satisfeita com o peso da criança, que vai ser pesada por arroba quando voltar, rs.

Uma amiga minha chegou de Salvador hoje e disse que ele ia ver o que era comer água, pelo que eu conheço o pessoal daqui gosta de se gabar de farrista, mas é como piracicabano ou inglês ou carioca. Nada pra causar espanto.

Xô ir que é dia de cuscuz de milho e mais tarde macarronada!

Ouçam Maria Gadúúúúúúú´!


P.S.: PORRA SABRIIINAAA!